quarta-feira, 22 de janeiro de 2020

Acordada.

Hoje o dia amanheceu chuvoso e escuro. Alguns dias mágicos amanhecem assim (quais dias não são mágicos?). Me deparei com uma declaração de amor ao acordar, encantou-me como se fosse para mim. Não era. Há muitos anos ninguém se declara para mim desta forma. Uma carta de amor é uma espécie de feitiço, hoje sei. Hoje sei o quanto eu, particularmente, sou vulnerável a este tipo de magia. Houve um tempo em que havia muitas cartas de amor, as paredes pareciam cobertas de palavras e cada mínimo detalhe, cada sulco na pele, cada folha caída se transformava numa infinidade de imagens e sentidos. Cartas de amor sugam o mundo pra dentro, como que abrem o peito para que vida entre inteira em beleza. O dia hoje amanheceu com o cheiro de uma carta de amor, como se tivesse aberto um portal ou um chacra que me transporta não em espaço ou tempo, mas em sentimento. Cada som (um vizinho mexendo na água, a buzina de um carro, alguém varrendo o chão) me encontra agora soando em minha pele e em meu peito, dissipa-se o véu entre mim e o mundo, é tudo um. Há um prazer indescritível em engolir o encantamento do mundo, sentir passar pela garganta, quente, e mantê-lo no estômago, mundificando dentro de mim. Fico, eu também, encantada. É deste lugar de onde saem as cartas de amor, daqui a vida é só beleza. Quem acordou essa parte de mim, como faço com que não durma?