terça-feira, 28 de novembro de 2017
Sobre a batalha entre a Rainha de Gelo e Aslam.
Mas é claro que existe essa parte minha que é capaz de destruir, congelar, esvaziar todo sentimento e transformar tudo numa grande espiral de banalidades e rancor. É claro que nessa parte nunca chega o Natal, chega tudo o mais, as festanças de Carnaval, o desvario, a luxúria lancinante, as danças sensuais de São João, mas o Natal, esse não pode chegar. Porque essa parte é avessa a familiaridades, a afeto gratuito, a cuidados muitos, ainda que tortos. Essa parte, polaridade, é à qual eu preciso escolher todos os dias não ceder, essa Rainha vinga e devasta e conquista, conquista para destruir o que houver de belo, é essa Rainha que me protegeu em tantos momentos das feridas duras, rasgadas, da vida. Eu não sabia do Leão. Ou sabia, mas a dor de perdê-lo foi grande demais para saber que ele renasce. Essa outra parte que é luz e construção, e afinidade e afeto, essa parte que faz família em tantas casas outras, essa parte que é amor, a mim, a outros, à vida. Às vezes o Leão se esconde ou morre, e parece não ter fim esse gelo de vida sem Natal, às vezes eu faço com que não tenha fim esse gelo de vida sem Natal. A vida no frio, por mais que permita que eu mostre, a mim e a outros, tanto do meu poder, perdeu o sentido. A revanche, a disputa pelo poder, as artimanhas, os jogos, nunca chega a ceia de Natal, a família, os filhos, o amor que aquece a alma, ficava a morrer de fome, fingindo que gelo e sorvetes eram o bastante. Hoje eu quero a ceia, a família reunida, o amor que perdoa, que aquece, que constrói, hoje eu quero baixar a guarda e deixar que chegue a primavera. Que as flores curem a dor, que mais são as flores que objetos mágicos de cura? Que Aslam guie os meus passos, que permita que haja vida onde eu pisar, não mais gelo e distorção, que a vida aconteça com toda sua potência, com todo o seu Sol. Com todo o meu Sol.
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